domingo, 30 de dezembro de 2012 | Autor:

Um bom exemplo de praticante do Método DeRose, na área de conceitos, é a ação efetiva para transformar o mundo através da civilidade (podemos chamar de boas ações ou até de boas maneiras).

Todos os dias vamos computar quantas ações louváveis protagonizamos.

Três vezes três

três é um dos números reverenciados nas nossas raízes hindus. Vamos, então, fazer nossa contagem a partir dele.

Se você realizar hoje menos de três boas ações, considere este como um dia de chumbo.

Se realizar três ações de boas maneiras, este foi um dia de bronze.

Com duas-vezes-três ações meritórias, seu dia terá sido de prata.

Conquistando três-vezes-três ações de civilidade, comemore um dia de ouro.

Mas se conseguiu realizar mais de três-vezes-três ações, você é o nosso herói e o seu dia foi de diamante!

Que ações poderiam ser essas?

Efetue uma doação a alguma instituição de assistência social séria.

Participe como voluntário em alguma campanha filantrópica.

Envolva-se de corpo e alma com as campanhas da Defesa Civil da sua cidade.

Dê comida a quem tem fome.

Dê um agasalho a quem tem frio.

Dê um sorriso, uma atenção, um afeto a quem esteja precisando disso tanto quanto o que tem fome e o que tem frio.

Salve um cão abandonado.

Regue as flores do jardim do seu vizinho, desinteressadamente.

Pare o carro a fim de dar passagem a um pedestre que esteja querendo atravessar a rua, mesmo fora da faixa.

Socorra um desconhecido que esteja caído na calçada tendo um ataque epilético.

Dê flores a um amigo.

Não se abale quando outro motorista for mal educado, der uma fechada ou mesmo bater no seu carro.

Peça desculpas, mesmo quando tiver a certeza de que está com a razão.

Trate bem um mendigo que venha pedir dinheiro.

Telefone para um amigo, colega ou parente, só para perguntar como vai.

Converse amenidades com um desconhecido no supermercado ou no shopping center.

Dê a mão a uma senhora para sair do carro.

Ofereça-se para ajudar a carregar as compras ao vizinho no prédio em que mora ou ao desconhecido no estacionamento.

Carregue a bolsa pesada da sua amiga.

Ouça o desabafo de quem precise falar sobre um problema.

Jogue no lixo algo que alguém tiver deixado cair fora da lixeira.

Acaricie um cão.

Elogie o filho de alguém.

Dê os parabéns a um colega ou concorrente por uma conquista ou por um projeto vitorioso.

Dê uma gorjeta mais substancial do que o mínimo de praxe.

Agradeça pelo serviço e elogie a atuação do garçom ou de outro profissional.

Diga “você está com a razão”.

Sorria para as pessoas no clube, nas lojas, na sua empresa.

Trate com cortesia o seu porteiro, a sua auxiliar de limpeza e todo o pessoal subalterno.

Recicle.

Dê informações, auxilie, oriente (na empresa, no trânsito, na faculdade).

Converse com os funcionários que o atendem.

Escute as reivindicações do cônjuge (esposa ou maridão). E atenda-as.

Diga obrigado e sorria para alguém na rua, no trânsito, nas compras.

Responda com gentileza a um vizinho irritado.

Acalme um colega, um familiar ou um amigo quando ele estiver zangado com você.

Não insulte a quem bem que merecia.

Quando não precisar de algum objeto ou roupa não o guarde nem o jogue fora: procure quem esteja precisando e faça-lhe presente. O que não presta para um pode ser uma bênção para outro.

Dê uma informação útil a alguém.

 

ISTO É O MÉTODO DeROSE EM AÇÃO EFETIVA!

ESTES SÃO ALGUNS EXEMPLOS DOS NOSSOS CONCEITOS E VALORES.

 

quarta-feira, 5 de dezembro de 2012 | Autor:

Prefácio

Um dia deparei-me com uma chocante verdade: nasci no século passado! Está bem, não só eu como todos os habitantes do planeta que nasceram até o raiar do ano 2001. Mas o fato é que mais de 60 anos de vida ensinam muita coisa.

De uns tempos para cá comecei a notar que para tudo sobre o que as pessoas me consultavam eu tinha uma regra ou conselho decorrente de experiências já ocorridas comigo nas mesmas circunstâncias uma porção de vezes. Era como se eu já tivesse visto aquele filme e soubesse exatamente como iria terminar.

Então, comecei a escrever os conselhos ou observações que eu tinha para repartir com quem vinha conversar sobre seus negócios, sua família, sua saúde, sua questões afetivas…

Muitas coisas que a vida me ensinou, já coloquei em outros livros. Assuntos referentes à etiqueta. reuni no livro Boas Maneiras. Palavras que falam ao coração, publiquei no Mensagens. Conselhos sobre casamento escrevi no Alternativas de relacionamento afetivo. Conceitos e técnicas a respeito de sexualidade, editei no livro A sexualidade sacralizada. Reflexões e insights sintetizei no Sútras – máximas de lucidez e êxtase. Temas referentes a uma vida riquíssima de experiências, viagens e fatos que dariam vários filmes, compilei na autobiografia Quando é Preciso Ser forte. Técnicas para maximizar a saúde e o autoconhecimento, reuni no Tratado de Yôga. Mas ainda havia muita coisa para ensinar e que não se encaixava em nenhum dos títulos acima.

Todo esse material eclético, eventualmente engraçado, mas essencialmente escrito para facilitar a sua vida, poupar o seu dinheiro e decepções, salvar seu casamento e suas amizades, evitar acidentes e processos criminais, minimizar a ocorrência de assaltos, furtos e agressões, tudo isso veio para este volume. Se você já nasceu com 50 anos de idade bem vividos e viajados, talvez este livro não tenha muito para lhe ensinar. Mas… vou-lhe confessar uma verdade: até eu preciso lê-lo de vez em quando para não repetir erros cometidos no passado. Afinal, ninguém erraria se ouvisse os próprios conselhos. Dizem que se conselho fosse bom ninguém dava de graça. Então, tudo bem: compre o livro!

A capacidade de autocura do organismo

Uma das coisas que a vida me ensinou foi que o corpo se cura sozinho na maior parte das ocorrências. Corremos para os remédios em busca de apoio e ajuda, mas o organismo, muitas vezes, teria conseguido curar-se sem a necessidade deles. Não estou falando do efeito placebo. Estou me referindo ao processo natural de reação e autocura. A homeopatia diz: Similia similibus curantur. DeRose redargue: Natura naturibus curantur.

Você já notou que algumas pessoas bem idosas declaram que nunca foram ao médico? E outras que vivem tomando remédios continuam doentes e, com frequência morrem cedo?

Certa vez, numa consulta médica, ao ver que os remédios receitados eram meio fortes e muito químicos, perguntei ao clínico se ele não conhecia outro meio de resolver o problema. Ele me disse que sim, tomando chazinhos medicinais da nossa flora, pois fariam o mesmo efeito. Ou, ainda, poderia ir à praia, caminhar a pé, fazer amor, praticar Yôga! Questionei, então, porque havia me receitado toda aquela parafernália química e ele justificou declarando que os pacientes em geral cobram isso do médico e que se o profissional não receitar os produtos da indústria farmacêutica, o cliente acha que trata-se de um mau médico e troca-o por outro que recomende bastante remédio.

Anos depois, minha esposa ficou grávida e passei a ir com ela mensalmente ao ginecologista. Ao longo dos nove meses de gestação, notamos que a qualquer sintoma mencionado pela paciente, o médico dizia:

– Está muito bem.

E não dava nenhuma medicação. No último mês confessei-lhe uma certa perplexidade, pois se o corpo da paciente podia resolver sozinho os problemas que iam surgindo, poderíamos ter economizado nove consultas. A resposta que esse ginecologista me deu foi semelhante à anterior e acrescentou que o organismo se cura sozinho de quase tudo. Mas, quando medicado, o paciente atribui a cura à eficácia do remédio e à competência do médico.

Por outro lado, quanta gente nós conhecemos que à primeira sugestão de que se submeta a uma cirurgia, corre para a sala de operações, especialmente se tem um seguro saúde que cubra tudo. Pergunto ao leitor: como está a saúde dessas pessoas? Está melhor do que a sua ou a minha? Ou está bem pior?

Note bem: não estou condenando as cirurgias ou medicamentos necessários. Procuro apenas salvar a sua vida, propondo que ao invés de levar uma facada na barriga e outra no bolso, você repense cem vezes. Uma cirurgia pode lhe custar muitas dores, pode dar errado e pode resultar em acidentes cirúrgicos, choques anafiláticos, paradas cardíacas, enganos do instrumentador, infecção hospitalar ou até falecimento na mesa de operação. Medicamentos desnecessários podem gerar efeitos colaterais, intoxicações medicamentosas, dependências etc.

Repito para que fique bem claro: se precisar, tomarei remédios e aceitarei a contra-gosto uma cirurgia. Mas antes tentarei tudo o que for possível, começando por uma alimentação tão mais rígida quanto mais radical for a circunstância.

Alimentação saudável, mudança de ares, férias, carinho, sexo, alegria, mudança de profissão, podem salvar a sua vida. Ou podem ampliar expressivamente a sua expectativa de vida. E se nada disso funcionar, pelo menos você terá se divertido bastante e terá sido feliz o tempo de vida que ainda lhe restar.

Basicamente, com relação a este tema, o que a vida me ensinou é que a natureza cura. Só precisa de tempo e de uma ajudinha, reduzindo os estímulos prejudiciais.

Quando você tiver algum problema de saúde, além de consultar o seu médico e mais uma segunda opinião (e uma terceira, quarta, quinquagésima…) é importante consultar também as pessoas que já passaram por problemas semelhantes. É curioso, mas os que sofreram do mesmo mal podem lhe dar dicas que os médicos, incompreensivelmente, ignoram.

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quinta-feira, 15 de novembro de 2012 | Autor:

Este é um novo capítulo que será inserido no meu livro Ser forte.

Antes de prosseguir relatando as peripécias das minhas vidas, preciso contextualizar onde se passa a história. Vivo em um subcontinente que não considero seja um simples país e sim um conglomerado de nações federadas sob uma única nacionalidade. Somos vinte e sete estados (um deles se denomina Distrito Federal), cada qual com a sua diferente etnia, religião, culinária e vertente linguística. Nas distintas combinações destas quatro variáveis, em proporções diversas, teceu-se uma vastíssima rede de culturas denominada Brasil.

Como o país promoveu uma imagem equivocada de si mesmo, preciso esclarecer que nossa terra e nossa gente talvez sejam muito diferentes da percepção que o leitor acalenta, mesmo que seja meu conterrâneo!

Estes esclarecimentos também servirão para forrar a cultura de alguns povos que sistematicamente nos perguntam sobre cobras e macacos atravessando a Avenida Paulista. Ou que declaram àquela curitibana ou gaúcha “Você não tem cara de brasileira. Você é loira de olhos azuis!” Assim, para incrementar a cultura geral de muita gente pelo mundo afora, aqui vão algumas informações que provavelmente irão surpreender.

Somos a sexta maior economia do mundo. Nossa população corresponde a um terço de toda a população da América Maior[1], a qual conta com 33 países. O nosso país sozinho (8.514.876 km2) é maior que toda a Europa Ocidental.

Não se pode estereotipar o nosso povo, já que cada “nação” foi edificada a partir de imigrações muito diferentes. Não podemos, por exemplo, declarar que o povo aqui é branco, ou negro, ou oriental, ou aborígene. Cada estado tem preponderância de alguma dessas etnias ou de uma miscigenação particular. Também não podemos declarar que a população seja católica, ou protestante, ou judia, ou muçulmana, ou shintoísta, ou budista, ou espírita, ou que siga cultos afro. Cada cidade tem sua predominância. Para mencionar apenas alguns desses vinte e sete estados, podemos citar:

O estado do Rio Grande do Sul (281.748 km2) tem território maior que a Inglaterra, Escócia e Irlanda do Norte juntos (U.K. = 244.820 km2). A imigração foi principalmente alemã e italiana. Em algumas cidades, ainda é possível escutar os dialetos alemães (Hunsrückisch, Plattdeutsch) e italianos.

O estado de Santa Catarina (95.346 km2) é maior que a Hungria (93.030 km2). Nele, recebemos principalmente a imigração alemã e até hoje há cidades onde só se fala alemão, com exceção da capital, na qual a imigração foi principalmente açoriana. Também tivemos a presença italiana no sul do estado.

O estado do Paraná (199.709 km2) tem território maior que a Grécia (131.990 km2). A imigração foi principalmente alemã, holandesa, italiana, polonesa, ucraniana, japonesa e árabe.

O estado de São Paulo (248.808 km2) tem território em que cabem mais de oito Bélgicas (30.528 km2). A imigração majoritária foi a italiana. Depois, a japonesa. Em seguida, a “árabe” (libaneses, sírios e turcos). Tem uma população israelita bastante expressiva e que se dá muito bem com o segmento islâmico. Convivem lado a lado, fazem negócios entre si e ocorrem até casamentos entre suas famílias!

O estado do Rio de Janeiro (43.909 km2) é maior que a Suíça (39.770 km2). A imigração foi majoritariamente portuguesa, contudo, na serra instalaram-se finlandeses, suecos, suíços e alemães.

O estado da Bahia (567.692 km2) sozinho englobaria facilmente a Inglaterra, Escócia, Irlanda, Grécia, Hungria, Bélgica, Suíça e Portugal. Tem uma presença preponderante da cultura africana na religião, na culinária, na língua e na etnia.

Os estados do Norte são alguns dos maiores. São fascinantes, um outro mundo. Essas regiões apresentam uma influência maior das culturas indígenas.

No Nordeste tivemos invasões holandesas que deixaram muitos genes recessivos de olhinhos azuis que reaparecem aqui e ali; e também invasões francesas que resultaram no nome da capital São Luís, em homenagem ao Rei Luís IX, patrono da França e ao rei francês da época (1612), Luís XIII.

No Sul e Sudeste as temperaturas no inverno podem chegar a alguns graus celsius abaixo de zero e em algumas cidades, como São Joaquim (SC), costuma nevar.

A Região Centro-Oeste abriga a nossa capital federal e Goiânia, duas cidades que foram projetadas com um planejamento estratégico.

Segundo o IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, dez por cento dos brasileiros tem ao menos um antepassado alemão e 25 milhões são descendentes de italianos, sendo que a metade desse número vive no estado de São Paulo. No entanto, como um todo, fomos colonizados pelo portugueses os quais nos concederam sua nobre língua que é a melhor língua literária do mundo. Oficialmente, falamos português. Coloquialmente, falamos brasileirês que possui uma sintaxe diferente da língua mater e um vocabulário bem diverso, com inumeráveis vocábulos agregados dos povos que para cá emigraram, mais os termos indígenas e africanos, o que tornou o brasileirês a língua de vocabulário mais vasto em uso hoje no mundo e de mais largo espectro fonético. No entanto, regionalmente, surgiram os dialetos simplificados do brasileirês, tais como o gauchês, o carioquês, o mineirês, o paulistês, o paulistanês etc. Fora esses dialetos do português, falam-se nesta terra nada menos que 180 línguas (isso mesmo: cento e oitenta)!

As pronúncias do português (brasileirês) são tão diversas que, normalmente, um habitante do Sul ou do Sudeste não compreende o falar do Nordeste. Temos, por exemplo, três tipos de r: o r francês, produzido na garganta; o r italiano, línguodental; e o r inglês (como em wright), articulado principalmente no interior de São Paulo e de Minas Gerais.

Com uma vastidão territorial como a que foi descrita, bem como com tantas línguas e dialetos, é impressionante que tenhamos preservado uma unidade federativa e uma identidade nacional.

Para completar esta contextualização, que aparência têm as nossas cidades? Bem, cada cidade tem sua personalidade própria, mas podemos afirmar que São Paulo é uma das mais sofisticadas, confortáveis e seguras cidades do mundo (seguras, sim, pois em 66 anos de vida fui assaltado uma única vez).

Se precisássemos comparar São Paulo com alguma cidade, essa seria New York. São Paulo lembra um pouco Manhattan, só que é melhor. A gastronomia é deliciosamente variada e refinada. Aqui encontrei a mais apurada qualidade de vida. Tanto que, depois de viajar o mundo todo, elegi esta capital para morar e como central internacional do nosso trabalho. Só o fato de que ninguém pára tudo e fecha para o almoço, como fazem em tantos países, já constitui um grande conforto. Além disso, a qualquer hora da madrugada encontramos bons restaurantes, livrarias e supermercados onde podemos fazer compras às duas, três ou quatro da manhã. Muitas empresas funcionam 24 horas por dia.

A qualidade dos produtos e serviços, bem como a cortesia dos profissionais e dos empregados paulistas é proverbial. Até a Polícia Militar é formada por pessoas educadas e de boa índole. O atendimento hospitalar é superior ao da maior parte dos países europeus. Ah! E os nossos chuveiros! É uma delícia retornar da Europa e poder tomar uma ducha decente, com chuveiro fixo na parede e muuuita água, sem o risco de que a água quente vá se acabar no meio do banho.

Então, pergunto eu, será que há crocodilos no Sena ou no Tâmisa?


[1] Denominamos América Maior àquela porção de terras e países que se estende pelas três Américas, desde a Patagônia, no extremo austral da América do Sul, passando por toda a América Central, até o México, na América do Norte. Mesmo assim, não gostamos que nos chamem de “americanos”. Acho que os argentinos, chilenos e todos os demais habitantes das Américas também não gostam e preferem ser conhecidos pelo nome da sua nacionalidade. Da mesma forma, imagino que os estado-unidenses também não gostem de ser chamados genericamente pelo nome de “americanos”, pois essa denominação só se refere ao continente, mas não ao seu país.

sexta-feira, 19 de outubro de 2012 | Autor:

Que confusão!

 

A confusão gerada pelos livros

Para o leitor iniciante no tema, muitos livros mais fazem confusão do que esclarecem. Esperemos que este não contribua para piorar a babel, mas, ao contrário, possa desfazer essa barafunda.

O motivo dos livros em geral embaraçarem a compreensão é que a maior parte foi escrita por leigos e o panorama não está claro nem para eles próprios que os escreveram. Ao tentar explicar, confundem. Há uma parcela de autores que conhecem o assunto, no entanto, esses pecam por achar que todo o mundo tem algum conhecimento e falam indiscriminadamente de Vêdas, Puránas, Upanishads, Bhagavad Gítá, Yôga Sútra, Mahá Bhárata, com bastante intimidade, atabalhoando tudo, sem esclarecer o que é cada um desses textos e onde se localiza em relação aos demais. O presente capítulo vai organizar essa miscelânea.

 

A confusão gerada pela desinformação

No Ocidente, quando falamos de Yôga, sempre surge alguém com alguma pergunta ou declaração que o associe ao Budismo. Ora, para começar, Budismo é uma religião e o Yôga é filosofia. Uma coisa não tem nada a ver com a outra. Para piorar a gafe, na Índia, menos de 1% da população é budista. Finalmente, para desespero de quem faz esse tipo de embrulhada, o Yôga faz parte do Hinduísmo[1], enquanto o Budismo é tecnicamente uma heresia[2] do Hinduísmo!

No entanto, o leitor poderá argumentar que encontrou várias referências em livros, que estabeleciam associações entre Yôga e Budismo. De fato, isso existe. Na maior parte das vezes ocorre pelas razões expostas nos primeiros parágrafos deste capítulo. Ademais, o Hinduísmo é tão antigo, tão vasto e tão multifacetado que poderemos, eventualmente, encontrar situações insólitas e contraditórias. Registre-se, porém, que isso não é a regra: é a exceção.

Existe um Yôga Budista? Sabendo-se que Budismo é uma religião, falar de um Yôga Budista é o mesmo que mencionar um Yôga Católico, um Yôga Islâmico, um Yôga Judaico. Seria algo como afirmar a existência de um Golfe Católico, um Futebol Luterano, um Vôlei Adventista, diferentes dos seus homônimos praticados por outras religiões. Não que o Yôga seja esporte. Poderíamos fazer a mesma comparação com outras áreas. Imagine se seria possível uma Informática Judaica, uma Física Nuclear Evangélica ou uma Engenharia Umbandista, diferentes da Informática, da Física Nuclear ou da Engenharia praticadas por outras religiões!

Contudo, às vezes encontra-se no Ocidente propaganda oferecendo “Yôga Cristão” como se isso fosse alguma especialidade. O que o prestador de serviços quer dizer, nesse caso, é que os cristãos podem praticar suas aulas sem nenhum conflito com a religião, o que, afinal, é verdade. Mas Yôga Cristão não é um ramo de Yôga.

A confusão gerada pelo mercado

Tão incoerente quanto barafundar o Yôga com religiões é misturá-lo com nacionalidades. É comum encontrarmos oferta de Yôga Tibetano, Yôga Egípcio, Yôga Israelense. Ora, Tibet, Egito, Israel são países. “Yôga Tibetano” faz tanto sentido quanto “Yôga Brasileiro”, “Yôga Argentino”, “Yôga Português”. Se existe Yôga no Tibet ele tem que ser identificado pelo seu nome verdadeiro: Rája Yôga, Hatha Yôga, Karma Yôga, Bhakti Yôga etc.

Também ouve-se falar de Yôga Desportivo, Yôga Artístico, Yôga Fitness, Power Yôga e por aí vai. Trata-se de táticas modernas para tentar atingir o consumidor onde ele é mais vulnerável: no apelo da novidade. Yôga Desportivo será Hatha Yôga? Yôga Artístico não será Hatha Yôga também? Power Yôga e Yôga Fitness não serão igualmente Hatha Yôga? Mas, na opinião daqueles, Hatha Yôga está gasto, ultrapassado, démodé. Ninguém mais quer praticar Hatha Yôga no Ocidente. Então, nada melhor que tentar outra denominação.

 

 

 

 

A estrutura do Hinduísmo

 

Vamos localizar o fio da meada

Para desfazer o imbróglio, vamos estudar a estrutura do Hinduísmo. Talvez assim compreendamos que ao expressar nossos pontos de vista, estaremos sendo ortodoxos, sim, mas intolerantes jamais.

Primeiramente, para facilitar a compreensão, vamos dividir o estudo do Hinduísmo em dois grupos de Escrituras: Shruti e Smriti.

 

I. Shruti

Shruti é a parte mais antiga, cujas raízes localizam-se há mais de mil anos antes da nossa Era.

Shruti significa “aquilo que é ouvido”. Pode estar se referindo à tradição oral, em que o ensinamento era transmitido de boca a ouvido, ou então ao fato de que essas Escrituras foram recebidas através de revelação, por meio da qual os rishis “ouviram” os textos.

O Shruti é formado pelos quatro Vêdas – Rig Vêda, Sama Vêda, Yajur Vêda e Atharva Vêda. Os Vêdas, por sua vez, compõem-se das divisões denominadas Mantras[3], Brahmanas, Aranyakas e Upanishads. Destas, as Upanishads são as que mais nos interessam por apresentarem as mais arcaicas referências hindus sobre o Yôga.

Upanishadas

Upanishada ou Upanishad significa literalmente sentar-se junto, mas normalmente é traduzido como comentário. É que as Upanishads são os comentários dos Vêdas e, por isso, estão situadas no final deles[4].

As Upanishads servem para fundamentar filosofias como o Vêdánta e o Yôga. Há Upanishads especializadas em diferentes temas, como filosofia, medicina, religião, astronomia etc. Em seu livro Yôgakundaliní Upanishad, Sivánanda declara que existem 108 Upanishads. Em uma das minhas viagens à Índia, encontrei nos Himálayas uma cópia antiga da Rudráksha Upanishad, que explana sobre a semente de Rudráksha (Lágrima de Shiva), à qual atribuem-se propriedades medicinais. Interessamo-nos especialmente pelas, assim chamadas, Yôga Upanishads: Maitrí Up., Yôgatattwa Up., Yôgashára Up., Yôgakundaliní Up., Dhyánabindu Up., Nádabindu Up., Kshurika Up, Kathaka Up. etc., pois tratam do Yôga.

Upanishads (comentários) dos respectivos Vêdas

 

Rig Vêda (10 Upanishads)

Principal Upanishad:

Aitarêya.

Vêdánta Upanishads: 

Atmabôdha, Kaushítakí, Mugdala.

Samnyása Upanishads:

Nirvána.

Yôga Upanishad:

Nádabindu.

Vaishnava Upanishads:

Não há.

Shaiva Upanishads: 

Akshamálá.

Shakta Upanishads:

Tripurá, Bahvrichá, Saubhágyalakshmí.

 

Yajur Vêda (51 Upanishads)

Principais Upanishads:

Katha, Taittiríya, Ísávásya, Brhadáranyaka.

Vêdánta Upanishads:

Akshi, Êkáshara, Garbha, Pránágnihôtra, Swêtásvatara, Sháriraka, Sukarahasya, Skanda, Sarvasára, Adhyátma, Nirálamba, Paingala, Mántrika, Muktika, Subála.

Samnyása Upanishads:

Avádhúta, Katharudra, Brahma, Jábála, Turíyátíta, Paramhamsa, Bhikshuka, Yájnavalkya, Sátyáyaní.

Yôga Upanishad:

Amrtanáda, Amrtabindu, Kshurika, Tejôbindu, Dhyánabindu, Brahmavidyá, Yôgakundaliní, Yôgatattwa, Yôgashikhá, Varáha, Advayatáraka, Trishikhibráhmana, Mandalabráhmana, Hamsa.

Vaishnava Upanishads:

Kalishántarana, Náráyana, Tárasára.

Shaiva Upanishads:

Kálágnirudra, Kaivalya, Dakshinámúrti, Panchabrahma, Rudrahrdaya.

Shakta Upanishads:

Saraswatírahasya.

 

Sáma Vêda (16 Upanishads)

Principais Upanishads:

Kêna, Chándôgya.

Vêdánta Upanishads:

Mahat, Maitráyaní, Vajrasúchí, Sávitrí.

Samnyása Upanishads:

Árunêya, Kundika, Maitrêyí, Samnyása.

Yôga Upanishad:

Jábáladarshana, Yôgachúdámani.

Vaishnava Upanishads:

Avyakta, Vásudêva.

Shaiva Upanishads:

Jábálí, Rudrákshajábála.

Shakta Upanishads:

Não há.

 

Atharva Vêda (31 Upanishads)

Principais Upanishads:

Prasna, Mándúkya, Mundaka.

Vêdánta Upanishads: 

Átmá, Súrya.

Samnyása Upanishads:

Náradaparivrájaka, Parabrahma, Paramhamsaparivrájaka.

Yôga Upanishad:

Páshupatabrahma, Mahávákya, Sándilya.

Vaishnava Upanishads:

Krishna, Gáruda, Gopálatápaní, Tripádvibhútimahánáráyana, Dattátrêya, Nrsimhatápaní, Rámatápaní, Rámarahasya, Hayagríva.

Shaiva Upanishads: 

Atharvashikhá, Athavashira, Ganapati, Brhajjábála, Bhasmajábála, Sarabha.

Shakta Upanishads:

Annapúrna, Tripurátápaní, Dêví, Bhávaná, Sítá.

 


Total por tipo de Upanishad

Principais Upanishads:

 10

Vêdánta Upanishads: 

 24

Samnyása Upanishads:

 17

Yôga Upanishad:

 20

Vaishnava Upanishads:

 14

Shaiva Upanishads: 

 14

Shakta Upanishads:

    9

Total:

108

 

II. Smriti

Smriti é divisão mais nova. A maior parte dos textos deste grupo tem pouco mais de 2000 anos. Smriti significa memória, referindo-se provavelmente às recordações posteriores daquilo que o Shruti ensinara no passado remoto. Fazem parte do Smriti as divisões: Smriti, Itihasas, Puránas, Ágamas e Darshanas.

a) Itihasas

Os Itihasas são os épicos Mahá Bhárata (Grande Índia) e Rámáyana (o Caminho de Ráma ou a Vida de Ráma). Onde fica o Bhagavad Gítá? Ele é um capítulo do Mahá Bhárata. O Mahá Bhárata é a descrição de uma guerra. O Bhagavad Gítá (a Canção do Sublime) é a descrição de uma batalha daquela guerra. Relata fatos reais redigidos de forma poética, com ensinamentos filosóficos e éticos.

b) Puránas

Purána significa antigo, antiguidade. São textos mais acessíveis que permitem ao indiano médio compreender os ensinamentos antigos sob uma redação mais simples. Contêm muitos contos, fábulas e outras formas populares para transmissão do conhecimento. Estes são alguns Puránas:

Shiva Purána, Vishnú Purána, Brahma Purána, Brahmanda Purána, Skanda Purána, Linga Purána, Agni Purána, Naradiya Purána, Padma Purána, Gáruda Purána, Varaha Purána, Bhagavata Purána, Brahmavaivarta Purána, Markandêya Purána, Bhavishyat Purána, Vamana Purána, Kúrma Purána, Matysa Purána etc.

c) Ágamas

Os Ágamas são manuais do culto vêdico, textos que ensinam ao devoto como oficiar o culto pessoal e doméstico às suas divindades eleitas. Podemos também entender os Ágamas como tendências devocionais.

Certa vez, estávamos diante do Gandhi Memorial, em Delhi, e um distinto senhor, muito solícito como em geral os indianos são, explicou-nos que, segundo alguns estudiosos, contam-se 330 milhões de deuses no Hinduísmo. Ainda que esse número seja bastante exagerado, não teríamos espaço nem justificativa para descrever aqui centenas de tendências devocionais. Portanto, vamos ater-nos às três principais, aquelas que abarcam a maciça maioria da população. São elas:

1- Shaiva (Shivaísmo)

Consta que Shiva foi um bailarino que viveu na civilização Harappiana ou Dravídica. Atribui-se a Shiva a criação do Yôga. Shiva tem mais de mil nomes e aspectos. Natarája é o Shiva bailarino. Shankar é o Shiva saddhu, meditante. Rudra é o Shiva irado. Pashupati é o Shiva senhor dos animais. Representa o Aspecto Renovador do Absoluto. Talvez por isso seja o patrono do Yôga, arte de renovação biológica e mental por excelência.

2- Vaishna (Vishnuísmo)

Vishnú é o Aspecto Conservador do Absoluto. É o equivalente ao Espírito Santo do Cristianismo. Vishnú se manifesta no mundo através de seus Avatares, que são as encarnações divinas. O Hinduísmo é tão tolerante que reconhece Buddha como um Avatar de Vishnú, apesar de Siddharta ter renegado o Hinduísmo! Krishna foi outra dessas encarnações. O Krishnaísmo constitui uma seita do Vishnuísmo. Assim, os Harê Krishnas pertencem a este Ágama.

3- Shakta (Shaktismo)

Shaktismo é o herdeiro do Tantrismo. Digamos que seja uma interpretação tântrica do Hinduísmo, ou uma forma aceita pela sociedade ariana (hindu) de praticar os preceitos tântricos. Shakta é o adorador da Shaktí. Shaktí significa energia e designa a mulher que, além de ser parceira, é cultuada como deusa viva.

Notemos que das três tendências devocionais mais expressivas da Índia (Shaiva, Vaishna e Shakta), duas delas (Shaiva e Shakta) estão alicerçadas na cultura pré-ariana, pré-vêdica.

d) Darshanas

Darshana significa ponto de vista. O Hinduísmo compreende seis darshanas, ou seja, seis pontos de vista segundo os quais ele pode ser professado. Independentemente das religiões e seitas, o Hinduísmo possui uma profusão de filosofias. Estas seis detêm o status do reconhecimento formal e acadêmico. Agrupam-se duas a duas, em função de suas afinidades.

Primeiro par:

1-Yôga

2- Sámkhya;

Segundo par:

3- Vêdánta

4- Purva Mimansa;

Terceiro par:

5- Nyáya

6-Vaishêshika.

Podemos constatar que o Yôga é casado com o Sámkhya e não com o Vêdánta, como muitos livros e instrutores insistem em ensinar.

Neste livro tratamos de Yôga. Comentamos um pouco sobre Sámkhya, já que o Yôga tem mais afinidade com o Sámkhya. Costumo ensinar aos meus futuros instrutores de Yôga: nosso foco deve ser o Yôga, portanto, invista 99% do seu tempo nele. Nosso Yôga é de raízes Sámkhyas, então, dedique 0,9% do seu tempo nele. A literatura moderna de Yôga é muito influenciada pelo Vêdánta, logo, aplique 0,1% do seu tempo para ter uma noção deste último.

Não estudaremos Mimansa, Nyáya, nem Vaishêshika, porquanto entendemos que o Yôga tem uma relação mais tênue com esses outros três darshanas.

Agora que compreendemos a estrutura do Hinduísmo, recordemo-nos de que o Yôga surgiu séculos antes do advento do Shruti, numa civilização que foi extinta justamente quando os arianos ocuparam o seu território. O Vêdismo, que depois foi denominado Brahmanismo, e, finalmente, Hinduísmo, contém muitos elementos da cultura dravídica, mas diversos autores costumam ignorar isso.



[1] Vale a pena esclarecer que refiro-me ao Hi/nduísmo como uma cultura e não como uma religião. É como o Cristianismo. O Cristianismo também é uma cultura que contém várias religiões e seitas.

[2] Ocorre uma diferença crucial entre o conceito de heresia do Cristianismo e o do Hinduísmo. No Cristianismo, através da História, o herege é perseguido, torturado e morto. A simples pecha de herege já embute um sentido pejorativo. Entretanto, no Hinduísmo o conceito de heresia é entendido no sentido universal: heresia é quando uma religião ou seita discorda e se afasta da doutrina-mãe, que constitui tronco principal. O Budismo teve suas origens no Hinduísmo e consiste numa contestação a ele, portanto, é uma heresia em relação ao Hinduísmo. Acontece que o Hinduísmo concede uma tolerância incomensurável às divergências e as absorve quase todas, fazendo-as constituir correntes do próprio Hinduísmo. No caso do Budismo as divergências eram muito relevantes e não foi possível absorvê-lo. Por outro lado, numa demonstração chocante de tolerância, o templo hindu Lakshmí-Narayan (Birla Temple) de Delhi, possui uma alameda que conduz a um templo budista, construído ao lado pelo mesmo mecenas, o Sr. Birla. Os devotos visitam o santuário hindu e, muitas vezes, estendem sua visita ao templo budista – e vice-versa.

[3] Em qualquer idioma moderno (excetuando-se o alemão), a palavra mantra transliterada, como qualquer outra do sânscrito, deve ser escrita com inicial minúscula, a menos que se trate de nome próprio. Aqui Mantras refere-se às Escrituras que contêm hinos. Não se trata dos mantras que utilizamos no Yôga.

[4] Daí deriva o nome da filosofia Vêdánta, termo que significa literalmente o final dos Vêdas, já que o Vêdánta é baseado nas Upanishads.

sábado, 14 de abril de 2012 | Autor:

Um bom exemplo de praticante do Método DeRose, na área de conceitos, é a ação efetiva para transformar o mundo através da civilidade (podemos chamar de boas ações ou até de boas maneiras).

Todos os dias vamos computar quantas ações louváveis protagonizamos.

Três vezes três

O três é um dos números reverenciados nas nossas raízes hindus. Vamos, então, fazer nossa contagem a partir dele.
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segunda-feira, 26 de março de 2012 | Autor:

Karma negativo e karma positivo

Mal é o nome que se dá à semente do bem.
DeRose

 

No Ocidente, temos uma visão muito distorcida a respeito do karma. Pudera! Esse conceito não é nosso, originalmente. Com toda aquela carga de culpa e pecado que cerca a cultura cristã, é compreensível que interpretemos o karma como algo forçosamente ruim, algo que temos de pagar com sofrimento. O marido faz algo desagradável e a mulher retruca contrariada: “Você é o meu karma!”. Mas se numa outra ocasião o esposo traz flores, ela não diz, exultante: “Você é mesmo o meu karma!”. Isso porque, para o ocidental, karma está necessariamente associado a algo negativo. Na realidade, não é assim.

Não existe karma bom ou karma ruim, assim como não existe fogo bom ou fogo mau. Nós assim os classificamos conforme suas consequências imediatas sejam convenientes para nós ou não o sejam. Diversas vezes aquilo que chamamos de karma ruim é algo que está criando as bases de algo muito bom no futuro. É como alguém que passe fome ou seja muito perseguido e, na hora, considere isso um mau karma. No entanto, com o passar do tempo essas desditas geram uma têmpera mais forte, que virá a ser bem útil, por um tempo bastante maior. Outro exemplo: Fulano chegou tarde e perdeu o avião. Ficou revoltado com a própria falta de sorte e blasfemou: “Maldito karma, esse meu. Perdi o voo.” Em seguida, o avião explode diante do seu olhar atônito, e ele só consegue balbuciar: “Bendito karma. Perdi o voo e estou vivo”. Afinal, o karma que o teria feito perder a aeronave, seria bom ou ruim? Depende da ótica. Na maior parte das vezes, não vemos o avião explodir, por isso continuamos a supor que o karma tenha sido mau.

O exemplo acima, de certa forma, remete-nos à velha comparação que nos é ensinada pela sabedoria popular: uma garrafa com água até a metade é considerada pelo pessimista uma garrafa meio vazia e pelo otimista, uma garrafa meio cheia. No entanto, sua classificação é apenas uma questão de ótica. Assim é com o karma e assim é com a vida. Muitas vezes temos todos os motivos para ser felizes, mas preferimos considerar as razões que nos fariam infelizes.

 

A única forma de não gerar karma

A única maneira de não gerar karma é atingir o nirbíja samádhi, pois ele consiste em uma total identificação com o Absoluto. E o Absoluto não contrai karma. Até então, respirou, gerou karma. A grande equação é gerar somente o que consideramos “karma positivo”, aquele que produz resultados que nos agradem.

domingo, 25 de março de 2012 | Autor:

Karma

O Universo é polarizado:
se tem gente contra (–), é porque você é a favor (+).

DeRose

 

Karma provém da raiz sânscrita kr, agir, que deu origem aos termos karma (ação) e kriyá (atividade). Karma é uma lei natural, como a lei da gravidade. Essa é a visão que o Yôga mais antigo, de fundamentação Niríshwara-Sámkhya[1], tem do karma. A visão espiritualista surge mais tarde e é reforçada na mesma medida em que a filosofia Vêdánta torna-se mais popular, especialmente a partir do século VIII d.C. Posteriormente, o conceito de karma é importado pelo Ocidente e cristianizado, ou seja, é feita uma releitura com base nos princípios cristãos de culpa e pecado. Karma deixa de ser uma lei que está fora e além do bem e do mal, para tornar-se algo com conotação negativa, que se deve pagar com sofrimento.

Se conhecermos os mecanismos que regem o dharma e o karma, teremos quase total domínio sobre a nossa vida e o nosso destino. Aliás, podemos definir karma como um destino maleável, que modificamos a cada minuto em virtude das nossas ações, palavras e pensamentos. Estamos o tempo todo a tecer nosso futuro imediato e distante.

Cada ação (karma = ação) protagonizada gera inexoravelmente uma reação, ainda que a ação inicial tenha sido apenas palavra ou pensamento. Então, devemos tomar muito cuidado com o que dizemos e com o que pensamos, não por uma razão meramente moral, mas por saber que não haverá como furtar-nos à responsabilidade das consequências.

Este livro vai nos ensinar como manobrar a lei do karma a nosso favor para transformar a nossa vida para melhor, mas não conseguirá auxiliar aqueles que usam da ação mal intencionada, da palavra caluniosa ou do pensamento malicioso contra outro ser humano.


 Diferenças entre karma e dharma[2]

Por mais que se faça o bem
sempre se desagrada alguém.
DeRose

 

O ocidental costuma confundir karma com dharma, no entanto, trata-se de duas categorias de leis completamente diferentes. A própria palavra dharma significa, literalmente, lei. Refere-se a qualquer lei humana: lei jurídica, regulamento de um clube ou condomínio, norma religiosa etc. Inclusive, o termo dharma também pode ser usado, por extensão, com o significado de religião. Assim, dharma é uma lei humana e karma, uma lei universal. Dharma está sujeito ao tempo e ao espaço, enquanto karma está além do tempo e do espaço.

O dharma é uma lei moral, pois depende das normas de um determinado país, região, cidade, grupo cultural e de uma determinada época. Mudando o tempo ou mudando o lugar, as regras mudam. O dharma depende dos costumes (mores, em latim[3]).

Na década de 70, uma jovem brasileira recém-chegada da Europa, atreveu-se a fazer topless em Ipanema. Foi presa por atentado ao pudor. Mas era de família influente e processou o Governo. Ganhou a ação judicial. A família devia ser mesmo muito poderosa, pois isso ocorreu durante a ditadura de extrema direita, profundamente moralista. O fato é que uma lei foi criada por causa dela, permitindo que se praticasse o topless em Ipanema. A partir de então, os policiais que antes aplicavam a repressão, agora defenderiam contra eventuais agressões a quem desejasse tomar sol mais à vontade. Uma questão de datas. No entanto, se a jovem passasse inadvertidamente a divisa de Ipanema com Copacabana, o mesmo policial que a defenderia na outra praia, nesta, seria capaz de lhe dar ordem de prisão. Uma questão de lugar.

 

O swadharma

Swadharma significa “o seu próprio dharma”. Constitui uma espécie de agravante ou atenuante, aplicado a cada caso específico. Por exemplo, o dharma declara que é proibido matar, mas no caso de um militar defendendo a pátria, o dharma abre uma exceção e ainda o condecora pela quantidade de inimigos abatidos.

Podem ocorrer diversas circunstâncias em que o dharma determine algo que seja difícil ou desagradável cumprir, ou cujo cumprimento traga algum inconveniente. O ideal é que o indivíduo se flexibilize para adaptar o seu dharma pessoal ao dharma geral da nação ou da instituição a que estiver atrelado[4]. Por exemplo, um jovem prestando o serviço militar e que queira obedecer à lei universal, o karma, ao invés de declarar que se nega a matar os inimigos e acabar preso, tachado de covarde ou traidor, poderá, mais inteligentemente, pedir transferência para o serviço de enfermaria. Em vez de se chocar de frente com as normas vigentes, terá dado a volta nelas, com um bom jogo de cintura.

Vemos, então, que o karma e o dharma eventualmente podem se contradizer. Numa tribo antropófaga, o dharma é matar e canibalizar os inimigos. Na profissão de policial, o dharma pode ser atirar para matar. Em caso de guerra, o dharma é trucidar o maior número possível de soldados adversários. Porém, o karma, em todos esses casos permanece imutável e universal: determina não matar. E não apenas não matar gente.

O próprio dharma shástra de Moisés, declara solenemente em Exodus, capítulo 20: “Não matarás.” Em parte alguma está escrito “não matarás homens”. Está escrito não matarás. Portanto, ao matar animais para comer[5], você está contra o karma, que é universal, e contra o dharma, que é a lei religiosa do Cristianismo e do Judaísmo[6].

Karma é apenas uma lei de causa e efeito, do gênero “cuspiu pra cima, vai receber uma cusparada no rosto”. A pura lei do karma é simplesmente mecânica e não espiritual. Nem sequer moral. Independe de fundamentação reencarnacionista ou até mesmo teísta. Refere-se a um mecanismo da própria natureza. Uma espécie de lei da gravidade muito distante do fatalismo que lhe atribuímos.

Comparando a lei do karma com a lei da gravidade, vamos concluir que as duas têm muito em comum. Se você cospe para cima, recebe a cusparada na cara. Não foi castigo. Nenhuma divindade interrompeu seus afazeres macrocósmicos para punir o hominídeo que teria feito algo “errado”. Se você ignora a lei da gravidade e segue caminhando numa trilha em que haja um grande fosso, cairá nele. Machucar-se-á. Sendo ignorante da lei da gravidade, vai ficar se lamentando pelos ferimentos e irá atribuí-los à vontade dos deuses ou dos demônios. Precisará cair outras e outras vezes, até aprender que não está se contundindo pelo desígnio de deuses ou maus espíritos, e sim porque há uma lei natural, a lei da gravidade, que o faz cair no fosso. Aprendida a lição, ao se deparar com o buraco à sua frente, você não continuará caminhando desavisadamente em direção a ele. Vai contorná-lo, saltá-lo, colocar uma ponte ou descer o fosso por um lado e subir pelo outro. Enfim, tomará alguma medida dentre as tantas alternativas que existem para cada caso, mas não cairá mais por ignorância da lei. Com o karma, é exatamente da mesma forma.

Outra comparação do karma com a gravidade: você monta numa bicicleta e sai andando nela. Gerou o karma potencial de uma queda de bicicleta. No momento em que você para e desce do veículo, terminou o seu karma potencial de uma queda de bicicleta. Teve início um outro karma potencial, o de escorregar e cair, o que já é bem mais suave.

Tudo o que fazemos, falamos, sentimos ou pensamos gera karma. A questão é saber como ir substituindo um karma que produza resultados inconvenientes por outro que cause consequências desejáveis.

O karma se divide em três tipos: passivo, potencial e manifestado. Temos absoluto domínio sobre os dois primeiros. Essa é uma boa notícia. Você nunca imaginou que teria controle total sobre dois te0rços do seu destino! Existe uma parábola que ilustra isso muito bem. O ser humano e o seu karma são como o arqueiro com suas flechas. Na primeira etapa, as flechas estão pousadas passivamente na aljava. Esse momento representa o karma passivo, com o qual você pode fazer o que bem entender. Na segunda etapa, o arqueiro saca uma das flechas, coloca-a no arco e tensiona-o. Ele pôs em estado de alerta uma energia potencial, mas ainda tem completo domínio, pois poderá conferir mais ou menos tensão ao arco, poderá atirar nesta ou naquela direção e, ainda, poderá desistir de lançar a flecha e guardá-la novamente no coldre. A terceira etapa, é quando o arqueiro solta a flecha. A partir daí não dá para voltar atrás, não é possível sair correndo para alcançar a flecha e fazê-la parar. Nesse caso, não há como impedir que toda uma sucessão de consequências se desencadeie. Somente sobre esta última forma de karma você não terá domínio.

Na verdade, o exemplo acima não pretende expressar uma precisão matemática de que tenhamos domínio sobre exatos dois terços do nosso karma. Trata-se de uma antiga comparação para nos proporcionar uma ideia de que temos domínio perfeito sobre a maior parte do nosso futuro.

Além disso, qualquer que seja o nosso karma, a liberdade que temos sobre as formas de cumpri-lo é bastante elástica. A sensação de restrição ou impedimento é muito mais decorrente dos próprios receios de mudar e da acomodação das pessoas, do que propriamente da lei de causa e efeito.

É como se o cumprimento de um karma fosse uma viagem num transatlântico. Você está inevitavelmente dirigindo-se ao seu destino, entretanto, poderá aproveitar a jornada de diversas maneiras. Poderá cumprir o percurso relacionando-se bem ou mal com os companheiros de viagem. A bordo, terá o direito de tomar sol, nadar, ler, dançar, praticar esportes. Ou de reclamar da vida, da monotonia, do cheiro de maresia, do balanço do navio, do serviço de camarote, do tamanho da escotilha, do enjoo… Todos chegarão ao destino, de uma maneira ou de outra. Só que alguns divertir-se-ão bastante no trajeto. Outros vão sofrer. Isso deve-se preponderantemente ao temperamento de cada um e não ao karma. Este é o verdadeiro conceito de karma. O resto é complexo de culpa.


[1] Pode-se grafar Niríshwarasámkhya ou, separadamente, Niríshwara-Sámkhya, neste segundo caso para melhor entendimento do leitor não familiarizado com os termos sânscritos. Quando escrevemos Dakshinacharatántrika-Niríshwarasámkhya Yôga damos preferência a usar o hífen apenas para associar o Tantra (de linha Dakshinachara) com o Sámkhya (de linha Niríshwara), formando assim um bloco que constitui o pré-nome desse tronco de Yôga, o qual parece ser o mais antigo.

[2] Karma e dharma, transforme a sua vida faz parte de uma coleção de 40 cursos gravados em vídeo/DVD que podem ser adquiridos na Universidade de Yôga. Recomendamos que os estudantes reúnam os amigos para dividir custos e compartilhar as aulas. Chamamos a isso Grupo de Estudos. Para conhecer o conteúdo dos vídeos consulte o livro Programa do Curso Básico. Nesse livro há também instruções sobre como conduzir um Grupo de Estudos. Se quiser acessar gratuitamente na internet um resumo dessas aulas, basta entrar no site www.uni-yoga.org.

[3] O termo moral provém do latim mores, costumes. Ou seja, imoral não significa algo intrinsecamente reprovável e sim algo que não faz parte dos costumes. As pessoas não estão acostumadas com tal ou qual procedimento e, por isso, estranham-no. É interessante observar que mores, em latim, significa costumes, mas more significa estupidamente, tolamente.

[4] Uma lição a respeito de flexibilidade. O poderoso carvalho disse ao bambu: “Você é muito magrinho. Basta uma brisa para fazê-lo dobrar-se. Eu, pelo contrário, nem sinto o vento.” Certo dia, ocorreu um vendaval que derrubou o carvalho, mas não afetou o bambu, pois ele se dobrou e depois retornou à sua posição.

[5] Literatura sobre culinária e gastronomia sem carnes: Método de Boa Alimentação, deste autor; Gourmet Vegetariano, de Rosângela de Castro; La dieta del Yôga, Edgardo Caramella, Editorial Kier.

[6] “E disse Deus ainda: Eis que vos tenho dado todas as ervas que dão semente e se acham na superfície de toda a terra, e todas as árvores em que há fruto que dê semente; isso vos será para mantimento.” (Genesis, cap. I, vers. 29).